Estou acompanhando como posso os protestos contra o aumento das passagens aqui em São Paulo, de já abusivos R$3,00 para R$3,20. E sei que tem muita gente reclamando pois estes protestos estão prejudicando sua rotina trabalho-casa.
Ontem eu e a Bia fomos em uma palestra sobre pensamento sistêmico na Fecomércio, que fica perto da estação Trianon. Na volta, deveria ser umas 9 horas, quando fomos subir pegar o metrô desciam 3 pessoas chorando. Estavam no protestos e nos alertaram para não subir pois a polícia tinha jogado gás lacrimogênio em tudo e continuava a atirar, ouvíamos as explosões. Enquanto conversávamos, desceu uma senhora, também com o rosto coberto de lágrimas – outra vítima do gás utilizado pela polícia.
Os protestos estão congestionando a cidade? Estão, a curto prazo, prejudicando milhares de trabalhadores? Sim.
Mas estes protestos estão sendo ignorados? Impossível.
Vandalismo?
A maioria das pessoas que reclamam do protesto atribuem os atos a “protesto vazio” e vandalismo. Infelizmente em toda a aglomeração existe “a massa agindo”, que são pessoas que por estarem em grupo reduzem seu senso de responsabilidade e agem de maneira covarde, fazendo o que não fariam se estivessem sozinhas. Estas pessoas são minorias no protesto.
A foto abaixo foi publicada pelo Anonymous Brasil, um dos grupos participantes dos protestos.
Esta foto é linda.
A marcha é pacífica e sem fim, se estas pessoas estivessem na rua para badernar e não para lutar por mudança o Brasil veria um banho de sangue, depredação.
Os protestantes não querem baderna, não querem borrachada e nem depredação. E tentam impedir isto dentro do protesto, infelizemente nem sempre é possível.
Manifestantes levantam lixeiras derrubadas na Av Paulista
Diferente do que foi noticiado em galerias de fotos no UOL, os manifestantes “mascarados” (leia: quem foi Guy Fawkes para entender o significados das máscaras do filme V de Vingança) percorreram toda a paulista levantando as lixeiras que estavam caídas.
[http://www.youtube.com/watch?v=UUoSGGeqGfc]
E o relato de uma manifestante que esteve lá:
Acho que o real poder da midia está na edição das coisas, pode parecer ingênuo pra vc mas pra mim hoje foi o corte frio da navalha.
Tentando me recuperar de todo o processo dessa passeata tensa vejo o video do jornal da madruga na Globo e quero gritar toda a raiva que aquilo me deu. Depredações antes de ataques da policia? Gente so querendo baderna? VIolência fora de controle? Caraca! Esses caras não estavam no mesmo lugar que eu! Aliás, eles estavam atrás da tropa de choque, como ver o mesmo que eu?
Eu vi uma radial leste cheia de gente, eu vi um glicério sorrir com manifestações que nunca passaram lá e vi uma parte da policia sim disposta a brigar, mesmo que não em toda tropa. No primeiro grito de uma manifestante magro e cabeludo ali no Pq Dom Pedro, a viatura avançou e de repente gritos de filho da puta ecoavam enquanto outra tambem avançava E a partir dai a coisa desandou. Litros de vinagre apareceram das bolsas alheias e a fumaça criava um cenário perfeito de guerra. Quem tava com o coração cheio de odio deixou-o transbordar em forma de pedra, pau e atiramentos. E mesmo que muita gente gritasse em coro e ritimo, não quebra! não quebra os vidros se partiam no chão e lixos jogados na rua eram recuperados. Ninguem fala daquele cara q começou a recolher os sacos pretos que outros jogavam, ninguem fala que muita gente o seguiu. Não acho a polica a fonte de todos os maus da sociedade, muito menos filhos da puta como foi gritado por muitos, mas acho sim que parte deles gostava da violência covarde onde a resposta a gritos eram tiros de borracha. Vi essa mesma policia, cheias de estratégia se proteger em escudos fortes, enquanto a todos os lenços. Vi a Paulista ser depredada de novo, principalmente quando o choque saio de trás do parque Trianom e muitas e muitas bombas de gás lançadas a esmo, e assim q suas nuvens sumiam, o odio quebrava o metro. Não acho inteligente. Mas acho covarde usar isso como arma. Sai de lá as 22h, onde alguns ainda resistiam e reagiam com mais violência a cada bomba. A cena da polica amiga que a Globo mostrou negociando, parecia cena de novela quando eu vi, e pirei.
O que mais fazer alem de voltar ali na quinta? Nada. Estarei lá com o meu próprio vidro de vinagre e talvez sapatos mais confortaveis. Quem vem comigo?
Ana Tannus no Facebook
São só 20 centavos
O objetivo do protesto não é economizar 40 centavos para ir a escola, ao trabalho ou ao cinema. O objetivo é mudar o Brasil, e forçar quem está no poder fazer o seu trabalho: servir o povo. Estes protesto já estão mudando o Brasil, e quinta terá uma nova manifestação, o mote “se a passagem não baixar São Paulo vai parar” tá valendo!
UPDATE
O Bruno Scartozzoni tem muito mais habilidade com as palavras do que eu, segue um post dele no Facebook sobre o que estou tentando expressar:
Protestar contra o aumento da passagem é protestar contra a inflação.
Protestar contra a inflação é protestar contra a falta de investimentos em infra-estrutura.
Protestar contra a falta de investimentos em infra-estrutura é protestar contra o dinheiro público sendo gasto a rodo para fazer politicagem e manter a base governista.
Protestar contra o dinheiro público sendo gasto a rodo para fazer politicagem e manter a base governista é protestar contra um governo que não tem um plano claro de desenvolvimento.
Protestar contra um governo que não tem um plano claro de desenvolvimento é protestar contra o estado atual da educação no Brasil (que resulta em um processo eleitoral pouco consciente).
Protestar contra o estado atual da educação (que resulta em um processo eleitoral pouco consciente) no Brasil é protestar contra a oposição molenga que nós temos.
Bruno Scartozzoni no Facebook
Sobre os 40 centavos por dia: se você está aqui, acessando a internet para ler meu texto provavelmente considere este valor insignificante.
Vamos a um cálculo rápido. No Brasil o salário mínimo é de R$678,00 e vamos fingir que todos os trabalhadores recebam, pelo menos, um salário mínimo, certo?
Milhares detes trabalhadores não recebem direitos trabalhistas, são diaristas, empregados não registrados, autônomos, catadores. Supondo que estes trabalhem apenas 22 dias por mês e tomem apenas uma condução (caso raro, pois estas pessoas normalmente são as que estão em periferias, dependem exclusivamente do transporte público e normalmente pegam três ou mais conduções para ir trabalhar).
Para cada condução que este indivíduo pega por dia ele vai pagar mais R$8,80 por mês. Três conduções diárias significa R$26,40 a menos no seu orçamento ao final do mês. Isso é 4% de “redução salarial” para uma pessoa que já não ganha o suficiente – e ele não pode ir protestar, pois ele vai perder o emprego informal ou não vai receber se for autônomo.
As vezes é ainda pior: esta pessoa não vê necessidade de protesto pois não tem idéia real da situação em que vive. Este cálculo que considero simples pode ser complexo para outras pessoas que não tiveram as oportunidade de estudo que eu tive (leia A diferença entre ver e viver a pobreza). Como reclamar de uma situação que as limitações educacionais impostas pela própria sociedade não permitem que eu entenda?
Eu não estou considerando que este indivíduo tenha filho que vai pra escola e talvez também use uma condução, que significa (pagando passe estudantil) R$4,40 por cada condução que o filho precisa pegar.
E se esta pessoa precisa ir para um posto de saúde ou quer ir no parque no final de semana (e levar os filhos), faça os cálculos.
São “apenas” 20 centavos para você, não para eles.
Quem reclama do protesto?
Quem reclama do protesto são as mesmas pessoas que, do conforto do emprego que só as fazem reclamar, passam as semanas a compartilhar fotos sobre nossas altas cargas tributárias, sobre as roubalheiras do mensalão, do Sarney e os absurdos falados pelo Feliciano.
Mas, com seus empregos infelizes usados para pagar suas parcelas do carro utilizado para entupir nossas desustruturadas vias urbanas, estão de consciência limpa “fazendo sua parte” votando em branco, assinando petição online e reclamando de forma cômoda, sabendo que “o Brasil é assim, protestar não vai mudar”.
Vai mudar sim,
nem que seja abaixo de gás lacrimogênio. Alguns pensamentos que recolhi pelo Facebook sobre o assunto:
Os críticos aos protestos do MPL de duas uma: Ou estão botando pra fora seus segredinhos reaças ou esqueceram que até hoje na história os direitos só foram conquistados na porrada. É aquele negócio, no Egito é lindo, em Londres “Nossa os ingleses são foda!” enquanto aqui quando o povo sai pra rua na pegada: “Bando de vagabundos, estudantes usando nike de 500 pratas protestando contra o nada”.
Alex Piaz no Facebook
O Fabio Rex prestou um serviço de tecla SAP dos comentários políticos sobre o assunto:
“Uma coisa é movimento, tem que ser respeitado, ouvido, dialogado. Outra coisa é vandalismo, é você interromper artérias importantes da cidade, tirar o direito de ir e vir das pessoas, depredar o patrimônio público que é de todos. Isso não é possível, aí é caso de polícia e a polícia tem o dever de garantir a segurança das pessoas”, – Alckmin.
SAP. “Quando fazem esses movimentos ~pacíficos~ fica moleza ignorar. A gente finge que presta atenção ou até nem precisa prestar atenção mesmo. Uns tapinhas nas costas, uma risadinha e deu. Agora quando a coisa fica feia, é caso de polícia mesmo. E por polícia, eu digo, descer o sarrafo.”
Fabio Rex no Facebook
Me perdoem o termo, mas os bunda-molistas que acham que nada vai mudar são ao mesmo tempo vítimas e culpados pelo Brasil estar nas mãos da corrupção. “Não vai mudar” é o pensamento mais desejado por quem está no poder.
Encerro este texto com uma citação de Garotos Podres:
Um dia você vai descobrir
que todos te odeiam
e te querem morto,
pois você representa perigo ao poder!
Garotos Podres
Quinta-feira tem mais. E São Paulo vai parar.
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